O medo que me acompanha

Quando pequeno, criança de sítio

Tinha medo da noite, dos sons que ecoavam
E de alguns bichos
De onça pintada e onça preta
Tremia de medo
Era um sacrifício!

Imaginava essas feras me devorando
Alucinadas, pelas frestas das janelas saltando
Por toda madrugada meu sono tirando
Só gostava quando chovia,
Pois respingava a cama que dormia.

De dia não tinha medo de nada!
Corria, brincava de tudo,
No igarapé nadava
O dia inteiro era uma farra!
Chato só era buscar o gado no pasto
Porque ficava perto da mata
E a mata tinha bicho selvagem, valente
Como: caititu, queixada, serpente.

Quando mudamos para a cidade
Deixei de ter medo de bicho da floresta,
Mas me fizeram ter medo de animais urbanos
Baratas, carros, bicho gente;
Principalmente àquelas desconhecidas
Tudo podia matar
Não suba aqui! Não pule acolá...
Você vai cair, vai se machucar...

Hoje cresci, estudei, aprendi muitas coisas
Venci muitos obstáculos pela vida
Mas engraçado!
Não deixei de ter medo de nada...

Por medo de ficar só fiz amigos, casei, tive filhos...
Por medo de passar fome estudei, trabalhei, construí casas...
Com medo de me feri ou matar alguém, nunca comprei armas...
Tento economizar por medo de algo faltar na vida...
Por medo de ficar triste sempre estou alegre, cantando, sonhando...
E por medo da morte vivo intensamente enquanto durar o medo que me
acompanha...